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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Considerações sobre a fé!


Uma questão que há tempos se discute e que já produziu diversas respostas diz respeito a possibilidade de crescer intelectualmente e ter fé religiosa. Isso se intensificou, ou talvez mesmo tenha sido inaugurado, com o surgimento da Filosofia, que adotou posturas tanto de aproximação quanto de afastamento da religião. Curioso é perceber que uma das mais interessantes e relevantes contribuições filosóficas, a socrática, teve início a partir de um Oráculo, portanto, algo vinculado à religião. É tentando interpretar o que o deus queria dizer pelo Oráculo de Delfos que  Sócrates inicia sua jornada filosófica. Porém, é preciso apontar que existem dois tipos de fé: uma não religiosa e outra religiosa. Segundo alguns filósofos e fenomenólogos da religião, a fé religiosa está ligada ao indivíduo por um ato pessoal de vontade, de confiança ou desconfiança de fundo na realidade. Vale destacar, então, que a fé é sempre algo a que se adere pessoalmente; é sempre a pessoa que escolhe crer ou não crer, e além disso, como crer. A fé religiosa é mais exigente que a não religiosa pelo fato de compreender em seu conteúdo elementos sobrenaturais, intangíveis. A gorosso modo pode-se pensar que exatamente por conter esses elementos a fé religiosa seria estática, no sentido de dever ser aceita passivamente. Uma citação de um importante pensador cristão (não estou certo se é Sto. Agostinho ou Sto. Anselmo), demonstra que não é suficiente repetir ou aceitar a fórmula da fé, mas é preciso compreendê-la ao delcarar: "credo ut intelligam" ("creio para entender") e há outro princípio relevante na teologia cristã: "fides quaerens intellectum" ("a fé que busca compreender"). Dessas citações inferimos que a ideia de fé estática não abarca a realidade mesma do que seja a fé, ao menos do ponto de vista da fé cristã, que valoriza a racionalidade. E a fé religiosa necessita da racionalidade exatamente porque necessita de uma compreensão principiológica, arquetípica. Nesse estágio é que, talvez, comecem a aparecer os problemas, pois há uma certa distinção entre o princípio religioso e a institucionalização da religião. Com a institucionalização começam a surgir as regras que nem sempre estão ligadas ao princípio fundamental da fé religiosa, mas que tende para a organização da instituição, o que a relfexão, a crítica passam a evidenciar. Um caso emblemático ocorreu com o Cristianismo do século IV. Visto como um movimento religioso marginal foi perseguido sob diversos imperadores, até a promulgação do chamado Edito de Milão em 313, por Constantino e o Edito de Tessalônica em 380, por Teodósio, terminando com a perseguição aos cristãos e abolindo o paganismo como religião oficial do Estado e instituindo o Cristianismo como religião oficial, respectivamente. Com isso o Cristinanismo passa a fazer parte da estrutura de Estado do Império Romano, o que concedeu aos seus membros, especialmente à sua hierarquia, certos privilégios e poder. Essa insitucionalização causou problemas entre os cristãos, pois muitos perceberam que isso promovia um afastamento dos princípios da fé cristã. Como religião do Império o Cristianismo se expandiu, expandindo, também, seu poder. Tal estrutura encontrou seu primeiro grande entrave com o Cisma de 1054, que além de divergências teológicas entre a Igreja do Oriente e do Ocidente, tinha como pano de fundo a questão de poder. No entanto, o maior questionamento que surgiria aparece no século XIII com uma figura amplamente reconhecida: Francisco de Assis. Este jovem aristocrata italiano tornou-se uma das pessoas mais simples que, talvez, o mundo tenha conhecido. Sua vida austera, porém, foi um questionamento duro do Cristianismo católico de seu tempo que afastara-se de seu princípio. De tal modo isso se verifica que ao tentar o reconhecimento de sua ordem, usou como princípios e regras o próprio Evangelho, que foi considerado pela Igreja como muito radical. Para Francisco de Assis a fé estava acima da instituição, mas nunca desligou-se dela, crendo que ela mesma fazia parte de sua fé. No século XX a chamada Teologia da Libertação, surgida na América Latina, fez um movimento parecido. Com isso queremos dizer que as críticas à fé religiosa, e sobretudo as que se fazem ao Cristianismo, não se dão no âmbito do conteúdo da fé, mas à sua institucionalização, ao poder e seu mau uso por parte dos religiosos e não da religião em si. Há uma confusão de papéis que identificam a fé com os religiosos. A crítica à fé religiosa deve ser direcionada àquela fé "burra", ou seja, irrefletida, que não busca compreender, que não busca a inteligência e à sua manipulação, pois a fé religiosa encerra uma racionalidade que deve ser explorada, mas que, como dissemos, ainda depende de uma atitude de confiança ou desconfiança de quem se debruça sobre ela como questão; e daí abre-se o caminho para a filosofia e a fenomenologia da religião para os que se enquandram no segundo caso e a teologia para os que se enquadram no primeiro.